Somatizações e Quadros DolorososSintomas que refletem o comprometimento físico das emoções. |
Tanto os Transtornos Somatoformes, quanto os fenômenos Dissociativos e Conversivos,
podem ser considerados transtornos psicorreativos, ou seja, aparecem
sempre como uma reação a algum evento de vida, a alguma emoção. Trata-se
de uma resposta do orgânico a uma vivência traumática. De certa forma
aqui se incluem também os transtornos psicossomáticos.
De modo geral, o Transtorno Somatoforme se
caracteriza por um salto do psíquico para o orgânico, com predominância
de queixas relacionadas aos órgãos e sistemas, como por exemplo,
queixas cardiovasculares, digestivas, respiratórias, etc.
Quando se usa o termo Conversão, embora exista da mesma forma um salto do psíquico para o orgânico, os sintomas são predominantes no “sistema de comunicação”
da pessoa com o mundo, ou seja, em sua mímica, em seus cinco sentidos,
em sua mobilidade e coordenação motora. Dessa forma, todos os quadros de
conversão se confundem com sintomas neurológicos, ou seja, desmaios,
formigamentos, paralisias, perda da voz, da visão, etc. Na Conversão os
sintomas aparecem sob a forma de perda da função de um ou de vários
atributos necessários à vida de relação. Isso significa que a
musculatura estriada e os órgãos sensoriais são afetados.
Os problemas de Somatização,
por sua vez, normalmente envolvem a clínica médica. Os sintomas
envolvem os diversos órgãos e sistemas, como por exemplo, dores no peito
(sistema cardiovascular), falta de ar (sistema respiratório), cólicas
abdominais (sistema gastroenterológico ou ginecológico), e assim por
diante.
Nos distúrbios de Dissociação
há, da mesma forma, um salto do psíquico, porém, não mais para o
orgânico: há um salto do psíquico para o próprio psíquico. Aqui são
afetadas a consciência e integração da pessoa com a realidade. A Dissociação,
segundo a CID.10, é representada pelos fenômenos onde o indivíduo fica,
repentinamente, dissociado dos estímulos internos e externos.
Todos
esses sintomas psicorreativos são reversíveis e não obedecem à
realidade orgânica ou à fisiologia médica conhecida. Eles obedecem sim, à
representação emocional que o sujeito tem de seus conflitos, de seu
corpo e de seu funcionamento. Através dessa representação sintomática
nada fisiológica podemos observar uma perda total da visão sem que o
reflexo foto-motor se encontre alterado, ou uma lombalgia com exames
neurológicos normais, tonturas com exames otoneurológicos normais e
assim por diante.
Vale
acrescentar que nenhum desses sintomas tem algo a ver com a simulação,
tratando-se, pois, da comunicação corporal de um conflito ou mobilização
emocional. É a expressão de uma necessidade psicológica onde os
sintomas não são voluntariamente produzidos e não podem ser explicados,
após investigação apropriada, por qualquer mecanismo clínico conhecido.
É
muito importante fazer uma boa distinção entre sintomas somatiformes e
conversivos com os sintomas psicossomáticos, embora todas essas
manifestações possam ocorrer em um mesmo paciente. Na Conversão e Somatização,
a representação da realidade vivenciada penosa, desagradável ou
traumática é reprimida para o inconsciente e sua energia psíquica é
deslocada para alguma zona do corpo, convertendo-se em sintoma.
Isso
pode ser o que acontece, por exemplo, quando uma paciente apresenta
queixa ginecológica vaga e incongruente, após ter participado de alguma
prática sexual com o namorado em desacordo com seus valores morais.
Nesses casos não existem lesões orgânicas, embora sempre exista a queixa
do sofrimento. Tais queixas conversivas ou alterações funcionais
independem da anatomia e fisiologia reais do organismo.
Na Doença Psicossomática,
diferentemente, de fato existe alteração orgânica confirmada por exames
clínicos, embora tais alterações tenham sido desencadeadas,
determinadas ou agravadas por razões emocionais. Na Doença Psicossomática o Sistema Nervoso Autônomo (SNA) é o mais mobilizado. Alguns autores aceitam a idéia de que a Doença Psicossomática
acontece quando há prejuízo da manifestação afetiva típica, ou seja,
quando há alguma dificuldade para a pessoa reconhecer e verbalizar
sentimentos e emoções (alexitimia).
Resumindo, a maneira mais didática de entender essa sucessão de termos parecidos e confusos pode ser assim:
TERMO
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SIGNIFICADO
|
Somatiforme, ou Somatomorfo
|
Toda
patologia psíquica que se faz representar no orgânico através de
sintomas compatíveis ou não com a patologia clínica, com a anatomia ou
com a fisiologia.
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Somatização
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Quando a parte física envolvida diz respeito aos órgãos e sistemas (coração, muscular, respiratório, genital...)
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Conversão
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Quando a parte física envolvida diz respeito à comunicação corporal da pessoa (cinco sentidos, musculatura, coordenação...)
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Dissociação
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Quando a parte envolvida diz respeito ao próprio psiquismo (confusão mental, delírios, desorientação...)
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Psicossomática
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Doenças
determinadas, agravadas ou desencadeadas por razões emocionais com
alterações orgânicas constatáveis (asma, hipertensão, dermatites,
diabetes...)
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Transtornos Somatoformes
A característica principal dos Transtornos Somatoformes
é a presença de sintomas físicos que sugerem alguma doença orgânica ou
física. A base do quadro clínico diz respeito à presença repetida de
sintomas físicos associados à busca persistente de assistência médica.
Apesar dos médicos nada encontrarem de anormal nos pacientes com Transtorno Somatoforme, as queixas persistem. E quando há alguma alteração orgânica, esta normalmente não justifica a queixa.
Para que haja um diagnóstico de Transtorno Somatoforme
deve haver, juntamente com as queixas, algum sofrimento ou prejuízo no
funcionamento social ou ocupacional. Caso isso não ocorra estaremos
diante apenas de um traço histérico de personalidade.
A pergunta que sempre está presente diante de casos com somatização é quanto à intencionalidade consciente dos sintomas. Nos Transtornos Somatoformes
a intencionalidade é inconsciente, ou seja, pode haver uma espécie de
“planejamento” inconsciente da sintomatologia, a qual passa a se
manifestar involuntariamente. Esse quadro difere da simulação, onde os
sintomas físicos não são conscientemente intencionais, isto é,
voluntários.
Há
estudos mostrando que 75% das pessoas adultas e sadias sofrem algum tipo
de dor ou de mal estar num prazo de uma semana. Isso quer dizer que, em
condições normais, o ser humano costuma apresentar alguma queixa sobre
si mesmo e isso não se constitui em nenhum transtorno psiquiátrico (White KL, Williams TF, Greenberg BG. The ecology of medical care. N Eng J Med 1961; 265: 885-892). Entretanto, devemos pensar em um diagnóstico de Somatização,
apenas quando a pessoa que se queixa acredita estar sofrendo de um
problema orgânico e busca diagnóstico e tratamento médico
persistentemente. Nesses casos parece haver uma relutância do paciente
em aceitar as seguidas negativas dos médicos quanto a possibilidade de
não haver nenhuma doença física.
A diferença entre os Transtornos Somatoformes e as Doenças Psicossomáticas
está no fato dessas últimas comportarem, junto com a queixa, realmente
alguma alteração orgânica constatável clinicamente, enquanto na
somatização não. Havendo confirmação de alterações orgânicas e, sendo a
doença em pauta influenciável (determinada ou agravada) por razões
emocionais, estamos diante de Doenças Psicossomáticas.
Alguns exemplos desses transtornos podem ser a asma brônquica,
hipertensão arterial essencial, psoríase, retocolite ulcerativa, entre
muitas outras.
De acordo com o DSM.IV, o Transtorno Somatoforme
se constitui num grupo de enfermidades psiquiátricas que são
caracterizadas quando o paciente apresenta sintomas físicos que sugerem
um transtorno físico mas, entretanto, não existe nenhuma causa orgânica
ou mecanismo fisiopatológico conhecido que explique os sintomas
completamente.
A indiscutível importância dos Transtornos Somatoformes
está na gritante freqüência com que esses pacientes visitam médicos das
mais variadas especialidades. Tão ou mais importante ainda é o fato
desses transtornos estarem quase sempre associados a outros quadros
emocionais.
Comorbidade
A
comorbidade do Transtorno Somatoforme (concordância com outra doença
simultaneamente) com outros quadros emocionais tem sido observada em
torno de 85% dos casos, com predomínio de transtornos depressivos e de
ansiedade. Essa comorbidade pode ser assim dividida (García-Campayo J, Sanz Carrillo C, Pesrez-Echeverría MJ, Campos R, Lobo A. Trastorno por somatización en atención primaria: aspectos clínicos diferenciales. Med Clin – Barc - 1995; 105: 728-733.)
Comorbidade do Transtorno Somatoforme
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Diagnóstico associado
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%
|
Distimia
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40.0
|
Transtorno de ansiedade generalizada
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25.7
|
Transtorno por angustia
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22.8
|
Abuso de analgéssicos
|
20.0
|
Agorafobia
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17.1
|
Depressão maior
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5.7
|
Depressão não especificada
|
5.7
|
Outros
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14.2
|
Note-se que somando distimia com outras depressões dá um total de 51.4% de comorbidade com o Transtorno Somatoforme.
|
Essa expressiva comorbidade convoca a formulação de hipóteses, entre as quais, perguntar-se se o Transtorno Somatiforme não seria apenas uma das manifestações (atípicas) dos estados depressivos e/ou ansiosos.
Entre os tipos de manifestação do Transtorno Somatiforme há maior prevalência o tipo Transtorno de Somatização (72%), a Hipocondria (63%), a Dor Crônica (59%) e o Transtorno Dismórfico Corporal (65%). (Bass C, Murphy M. Somatoform and personality disorders: syndromal comorbidity and overlapping devoopmental pathways. J Psychosom Res 1995; 39: 403-428.)
Importancia Clínica dos Trastornos Somatiformes
A importância clínica dos Transtornos Somatoformes
é totalmente determinada pela sua enorme prevalência, portanto,
determinada pela assiduidade com que os pacientes somatoformes se
utilizam dos sistemas de saúde. Eles estão presentes (muito presentes)
nos consultórios médicos de quase todas as especialidades e, não raro,
esses pacientes costumam visitar mais de uma especialidade
simultaneamente. Portanto, além da alta prevalência, deve ser levado em
consideração o alto custo social determinado pelos Transtornos Somatoformes.
Não
obstante, apesar da assiduidade desses pacientes no sistema de saúde,
eles estão continuadamente descontentes com o tratamento que recebem. A
dificuldade do médico em lidar com esse transtorno emocional faz com que
o paciente esteja constantemente trocando de serviço de saúde.
Transtorno de Somatização
Somatização
a rigor, significa passar para o somático, físico ou corpóreo,
somatizar. Normalmente essa expressão não deve ser tomada exclusivamente
como se tratasse de alguma categoria diagnóstica específica. A
somatização aparece na medicina em geral e na psiquiatria, em
particular, muito mais como um sintoma, encontradiço em muitos estados
emocionais, do que como uma doença específica.
Quem
trabalha em saúde está familiarizado com aquele tipo de paciente que
apresenta queixas múltiplas, imprecisas, confusas e difusas. Normalmente
começam dizendo “... não sei nem por onde começar doutor.” Essas pessoas costumam se sentir inconformadas com resultados negativos dos muitos exames que se submetem.
A categoria diagnóstica dos Transtornos Somatoformes e suas subdivisões (Transtorno de Somatização, Somatoforme de Dor, Disfunções Neurovegetativas, etc.)
abrangem uma série de pacientes cujos sintomas correspondem a respostas
somáticas, indicadoras de alterações emocionais e super valorizadas
através de ampliações das sensações corporais.
A característica principal do Transtorno de Somatização é a elaboração de múltiplas queixas somáticas,
recorrentes e clinicamente significativas. Uma queixa é considerada
clinicamente significativa quando resulta ou acaba determinando algum
tratamento médico. Também pode ser considerada clinicamente
significativa quando é capaz de causar algum prejuízo no funcionamento
social ou ocupacional da pessoa.
No Transtorno de Somatização normalmente há uma história de dor incaracterística e de difícil explicação médica que acomete predominantemente a cabeça, as costas, articulações, extremidades, tórax,
e/ou uma história de comprometimento nas funções de órgãos, como por
exemplo, em relação às menstruações, ao intercurso sexual, digestão,
funcionamento intestinal, etc.
As queixas do Transtorno de Somatização
freqüentemente levam o paciente a muitos exames médicos, radiográficos,
tomográficos e mesmo a cirurgias exploratórias desnecessárias, até
porque essas queixas são formuladas em termos dramáticos, são eloqüentes
e exageradas ou, curiosamente, ao extremo contrário, ou seja,
completamente indiferentes à sugerida gravidade do problema.
Freqüentemente as pessoas portadoras do Transtorno de Somatização
têm um histórico de hospitalizações e extensa trajetória médica, muitas
vezes buscando tratamento com vários médicos ao mesmo tempo.
Concomitantemente,
sintomas proeminentes de ansiedade e humor depressivo são muito comuns,
podendo ser até a razão principal para o atendimento médico. Os
transtornos Depressivo e de Pânico podem estar associados com muita freqüência.
Existem
numerosos sintomas físicos e variados, contínuos e queixados no
dia-a-dia que caracterizam mais a maneira desse paciente ser do que uma
maneira nervosa dele estar. Assim sendo, os somatoformes são pacientes
poliqueixosos, com sintomas sugestivos de muitos problemas de saúde, mas
que não se confirmam pelos exames médicos habituais.
Os
sintomas da somatização podem aparecer como quadros dolorosos
incaracterísticos, queixas cardíacas e circulatórias que não se
confirmam por exames especializados, distúrbios digestivos e
respiratórios, enfim, por queixas que refletem alterações em qualquer
sistema funcional, mas raramente se confirmam por exames clínicos ou de
laboratório. Nota-se sempre, inclusive com reconhecimento pelo próprio
paciente, de variação na intensidade das queixas conforme alterações
emocionais, embora a maioria deles insista em discordar do ponto de
vista médico que aponta para a possibilidade psíquica dos sintomas.
Nas características psicológicas associadas ao Distúrbio de Somatização encontramos com freqüência o humor depressivo e, em segundo lugar, o Transtorno Histriônico da Personalidade. Habitualmente os sintomas iniciam-se entre os 10 e 20 anos e, nas mulheres, é comum que problemas menstruais (Dismenorréia) sejam a primeira queixa.
Mesmo diante da suspeita do Transtorno de Somatização
o médico deve, obrigatoriamente, excluir a existência de alguma doença
orgânica real. Não deve ser negligenciada a possibilidade, mais que
comum, dos pacientes somatizados clássicos portarem, simultaneamente,
algum outro transtorno clínico orgânico. Desta forma, ressalta-se para o
diagnóstico do Transtorno de Somatização
puro a inexistência de alguma patologia orgânica real. Para o
diagnóstico do Transtorno Somatização é importante que os sintomas
causem sofrimento significativo ou prejuízo no funcionamento social ou
ocupacional ou em outras áreas importantes. Depois deste procedimento
clínico podemos observar uma extensa lista de sintomas possíveis de
refletir uma somatização:
SINTOMAS DO TRANSTORNO DE SOMATIZAÇÃO
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1 - vômitos
2 - palpitações
3 - dor abdominal
4 - dor torácica
5 - náuseas
6 - tonturas
7 - flatulência
8 - ardência nos órgãos genitais
9 - diarréia
10 - indiferença sexual
11 - intolerância alimentar
|
12 - dor durante o ato sexual
13 - dor nas extremidades
14 - impotência
15 - dor lombar
16 - dismenorréia
17 - dor articular
18 - outras queixas menstruais
19 - dor miccional
20 - vômitos durante a gravidez
21 - dor inespecífica
22 - falta de ar
|
A manifestação emocional somatizada não respeita a posição sócio-cultural do paciente, como podem suspeitar alguns, não guarda também relação com o nível intelectual, pois, como se sabe, a emoção é senhora e não serva da razão. O único fator capaz de atenuar as queixas é a capacidade da pessoa expressar melhor seus sentimentos verbalmente.
Quanto maior a capacidade do indivíduo referir seu mal-estar emocional
através de discurso sobre o que sente, como por exemplo, relatando sua
angústia, sua frustração, depressão, falta de perspectiva, insegurança,
negativismo, pessimismo, carência de carinho e coisas assim, menor será a
chance de representar tudo isso através de palpitações, pontadas,
dores, falta de ar, etc.
Entre
os próprios médicos ainda é muito forte a idéia de que o paciente
somatizador tenta enganá-los ou procede de má-fé. Às vezes e
intimamente, o médico se aborrece porque as queixas somatiformes não
obedecerem o que ele aprendeu nos livros tradicionais de medicina e, tão
diferentes assim eles passam a representar um desafio a seus
conhecimentos científicos e fisiopatológicos.
O Transtorno Somatização
é um transtorno crônico e flutuante mas raramente apresenta remissão ou
cura completa. É raro passar um ano sem que o indivíduo busque algum
atendimento médico, normalmente levado por queixas somáticas medicamente
inexplicáveis. Os critérios de diagnóstico tipicamente são satisfeitos
antes dos 25 anos, mas os sintomas iniciais freqüentemente estão
presentes desde adolescência. Os sintomas sexuais freqüentemente estão
associados com desajuste conjugal.
Transtorno de Conversão
O
paciente conversivo, como os histéricos de um modo geral, é extremamente
sugestionável, demonstrando com isso seu clássico infantilismo e falta
de maturidade da personalidade. Normalmente os afetos e relações
objectuais são bastante pueris nos histéricos, com predomínio da vida
fantasiosa na tentativa de negar uma realidade frustrante e penosa.
A
teatralidade dos histéricos é sempre marcante, ensaiando e interpretando
papéis que acreditam adequados a eles. Por mais que lhe sejam
dispensados carinhos a atenções, estes nunca são suficientes e
insistentemente estão a reclamar que ninguém os entende. Ele não simula
seus sintomas, não está enganando e não é caso de falcatrua. De fato o
conversivo está sofrendo e percebendo subjetivamente seus sintomas.
Neste
tipo de transtorno, sempre que o sintoma servir para o alívio de alguma
emoção (medo, ansiedade, angústia, desespero, frustração, etc.), haverá
um mecanismo chamado de Lucro Emocional Primário.
Diz-se “primário” porque é dirigido ao benefício emocional da própria
pessoa. Uma adolescente conversiva, por exemplo, diante de uma situação
vivencial potencialmente ansiosa, como pode ser o caso de uma briga
entre seus pais, recorre a uma síncope conversiva (desmaio). Com esse
desmaio, certamente ela estará se afastando da situação traumática e se
protegendo da ansiedade provocada pela briga dos pais.
Também um soldado com Transtorno Conversivo,
diante da ansiedade produzida pelo conflito entre o medo do combate e a
vergonha da fuga, poderá apresentar uma paralisia ou qualquer outra
limitação neuromuscular; se fosse um deficiente físico, não teria de
experimentar a ansiedade de saber-se um covarde já que, infelizmente, a
natureza impediu sua participação no combate através de uma doença
limitante de sua mobilidade. Nessa circunstância pode aparecer-lhe uma
paralisia, por exemplo.
Num outro mecanismo psicodinâmico a pessoa conversiva obtém um Lucro Emocional Secundário,
ou seja, um benefício junto aos espectadores. Ela conquista um suporte
de aprovação, complacência ou compaixão do ambiente para com sua falha
funcional ou para a evitação constrangedora da atividade que lhe é
nociva. A mesma adolescente do exemplo acima, que manifestou uma síncope
ao presenciar a briga de seus pais, despertará sentimentos de remorso
nas pessoas responsáveis pela sua crise, juntamente com uma compaixão
pelo seu estado deplorável e, inevitavelmente, receberá uma boa dose de
carinho em seguida.
CRITÉRIOS DE DIAGNÓSTICO PARA TRANSTORNOS CONVERSIVOS - DSM-IV
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A.
Um ou mais sintomas ou déficits afetando a função motora ou sensorial
voluntária, que sugerem uma condição neurológica ou outra condição
médica geral.
B.
Fatores psicológicos são julgados como associados com o sintoma ou
déficit, uma vez que o início ou a exacerbação do sintoma ou déficit é
precedido por conflitos ou outros estressores.
C. O sintoma ou déficit não é intencionalmente produzido ou simulado (como no Transtorno Factício ou na Simulação).
D. O
sintoma ou déficit não pode, após investigação apropriada, ser
completamente explicado por uma condição médica geral, pelos efeitos
diretos de uma substância ou por um comportamento ou experiência
culturalmente sancionados.
E. O
sintoma ou déficit causa sofrimento clinicamente significativo ou
prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras áreas
importantes da vida do indivíduo, ou indica avaliação médica.
F. O
sintoma ou déficit não se limita a dor ou disfunção sexual, não ocorre
exclusivamente durante o curso de um Transtorno de Somatização, nem é
mais bem explicado por outro transtorno mental.
Especificar tipo de sintoma ou déficit:
Com Sintoma ou Déficit Motor
Com Sintoma ou Déficit Sensorial
Com Ataques ou Convulsões
Com Apresentação Mista
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Transtorno Doloroso e Hipocondria
O diagnóstico de Transtorno Doloroso
veio satisfazer a necessidade de classificar os pacientes com queixas
dolorosas inconsistentes e de difícil entendimento médico, relacionadas a
estados emocionais. De fato, é como se fosse uma somatização mais
específica, ou seja, enquanto na somatização as queixas são muitas e
variadas, no Transtorno Doloroso a dor costuma ser uma só.
Para o diagnóstico de Transtorno Doloroso
a dor deve causar sofrimento significativo e algum prejuízo
sócio-ocupacional, sendo suficientemente severa para indicar uma atenção
médica. A dor pode perturbar severamente vários aspectos da vida
diária, como por exemplo, no emprego ou na escola, assim como causar
problemas de relacionamento, tais como desajuste conjugal e mudanças no
estilo de vida (desemprego, isolamento social, problemas financeiros,
etc.).
Esses
pacientes costumam usar freqüentemente o sistema de saúde, transformar a
dor em um foco importante de sua vida, usar exageradamente medicamentos
analgésicos e antiinflamatórios. Não é raro, portanto, que tais
pacientes desenvolvam dependência ou abuso de opióides e/ou
benzodiazepínicos.
Os
fatores psicológicos devem exercer um papel importante para esse
diagnóstico, seja na gravidade, na exacerbação ou na manutenção da dor.
Nunca é demais ressaltar que a dor não é voluntariamente produzida ou
simulada, como culturalmente se acredita, e esse aspecto involuntário é
que diferencia o Transtorno Doloroso da simulação.
O longo itinerário médico das pessoas com Transtorno Doloroso deve-se à convicção que eles têm sobre a existência, em algum local, de um médico que tenha a "cura" para sua dor. Eles podem gastar tempo e dinheiro na busca de um árduo objetivo.
Muitíssimo semelhante é o Transtorno Hipocondríaco.
Aqui existe uma preocupação, medo ou crença persistente de estar com
algum transtorno somático grave e progressivo. De modo geral a atenção
do paciente se concentra em um ou dois órgãos ou sistemas. Pode
acontecer também dos pacientes manifestarem queixas somáticas
persistentes ou preocupação duradoura com a aparência física. Sensações e
sinais físicos normais ou triviais são freqüentemente interpretados
pelo sujeito como anormais ou perturbadores.
De um modo geral, tanto o Transtorno Doloroso quanto o Hipocondríaco, parecem estar associados com outros transtornos emocionais, especialmente a Transtornos Depressivos e de Ansiedade. Pacientes cuja dor está associada à severa Depressão e aqueles cuja dor se relaciona a uma doença terminal, mais notadamente câncer, parecem estar em risco aumentado de suicídio.
Na prática, em pesquisa realizada no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (1995), houve prevalência de 73% de transtornos de ansiedade e 37% de transtornos depressivos
em 51 pacientes portadores de queixas difusas. Esses dados contribuem
para estruturar a idéia de que a somatização também possa ser uma forma
de expressão dos transtornos afetivos ou de ansiedade. As sólidas
constatações da associação somatização-depressão têm levado alguns
autores a acreditar que os quadros somáticos possam ser uma forma da Depressão se apresentar em algumas pessoas.
Transtorno Neurovegetativo ou Psicossomático
No Transtorno Neurovegetativo o paciente atribui seus sintomas a um transtorno somático de um órgão ou sistema controlado pelo Sistema Nervoso Autônomo (ou neurovegetativo). A diferença entre o Transtorno Neurovegetativo e o Transtorno de Somatização
é que nesse último existem as queixas, mas não existem alterações
clinicamente constatáveis, como por exemplo, existe a falta de ar sem o
broncoespasmo ou a sensação de lipotímia sem queda da pressão arterial.
Normalmente
as queixas neurovegetativas dizem respeito de um funcionamento
alterado, a um hiper ou hipofuncionamento, como por exemplo,
palpitações, transpiração, ondas de calor ou de frio, tremores, assim
como por expressão de medo e perturbação com a possibilidade de uma
doença física.
No
sistema cardiovascular, por exemplo, pode haver aceleração da freqüência
sem nenhuma correspondência clínica. Para ilustrar melhor as diferenças
de classificação podemos dizer que, se fosse uma somatização no sistema
cardiovascular, teríamos uma palpitação sem aumento da freqüência ou uma dor sem alterações orgânicas. Se fosse um Transtorno Psicossomático do sistema cardiovascular teríamos uma extrassistolia de fundo emocional eletrocardiologicamente constatável.
No sistema gastrintestinal o Transtorno Psicossomático
pode se manifestar como aerofagia, flatulência, cólon irritável,
diarréia, dispepsia, flatulência, piloroespasmo, úlcera digestiva, a
retocolite ulcerativa, etc. No sistema respiratório costuma haver
hiperventilação, suspiração, soluços, tosse persistente asma brônquica
(com broncoespasmo constatável). Na parte urogenital os sintomas
neurovegetativos dizem respeito à disúria, polaciúria, nictúria,
urgência miccional, etc.
para referência:
Ballone GJ - Somatizações e Quadros Dolorosos, in. PsiqWeb, disponível em www.psiqweb.med.br, revisto em 2011.